Pesquisa global da ONG Plan International aponta que meninas e jovens mulheres são desestimuladas a ocupar espaços de poder

Elas se sentem excluídas ou silenciadas quando expressam suas opiniões políticas. Apenas 5% já pensaram em um dia concorrer à presidência e 11% a outros cargos públicos eletivos. Estudo ouviu 29 mil meninas e jovens em 29 países, incluindo o Brasil

Com a chegada do Dia Internacional da Menina, celebrado em 11 de outubro, a ONG Plan International lança uma nova pesquisa global sobre a situação de meninas e jovens mulheres no mundo. Neste ano, o estudo Meninas em Espaços de Poder – A importância da representatividade ouviu 29 mil meninas e jovens mulheres de 15 a 24 anos, de 29 países, e descobriu que elas enfrentam muitas barreiras ao participar de espaços de poder, como atividades políticas, e se sentem mal representadas por pessoas que ocupam cargos políticos. Isso é bastante sintomático também no Brasil, que acaba de passar pelo primeiro turno das Eleições.

No Brasil, apenas 5% das participantes pensam em um dia concorrer à presidência da República e 11% a outros postos no Executivo e no Legislativo. No estudo global, esses números são maiores, com 20% para presidência (ou primeira-ministra) e 24% para outras posições. Um dos sintomas para esse descrédito na política no Brasil vem de ações e decisões de líderes políticos: 65% das meninas entrevistadas afirmam que esses foram os motivos para elas perderem a confiança nas lideranças políticas.

Globalmente, um quadro misto emergiu da pesquisa em relação a essas percepções sobre as lideranças políticas, sendo que por aqui o quadro, em geral, foi mais negativo do que a média da pesquisa mundial. No país, 70% das entrevistadas discordam que os líderes políticos agem em benefício das prioridades de meninas e jovens (em comparação com 43%, globalmente), 66% discordam que as lideranças políticas conhecem e compreendem seus pontos de vista (em comparação com 45% no cenário global), e 66% também discordam que os líderes políticos estejam dispostos a conversar com elas (em comparação com 42% na pesquisa global).

“O recorte brasileiro da pesquisa Meninas em Espaços de Poder – A importância da representatividade aponta que as meninas e jovens mulheres brasileiras têm consciência das situações enfrentadas no dia a dia por mulheres líderes, seja em espaços de poder comunitários ou mesmo em esferas mais altas do Poder Público”, afirma Cynthia Betti, diretora executiva da Plan International Brasil. “É muito sintomático que as mulheres na liderança enfrentem um ambiente muito mais hostil e sejam desacreditadas em seus papéis e suas opiniões. Nosso maior desafio é fazer com que as meninas entendam que elas são parte fundamental da construção do presente e do futuro e para que não desistam de ocupar lugares que precisam ser delas.”

Entre os desafios que as meninas enfrentam estão o fato de a política não estar aberta à participação delas (40%), políticos não ouvirem meninas e jovens mulheres (39%) e a falta de lideranças políticas inspiradoras (38%). A violência política contra mulheres também foi percebida na pesquisa. No mundo todo, 40% das participantes concordam que as mulheres na política sofrem abuso e intimidação e 42% concordam que elas são julgadas pela aparência ou pela forma como se vestem. Estas porcentagens são maiores no Brasil, com 55% e 48%, respectivamente.

“Apesar disso, estamos vendo meninas e jovens mulheres redefinindo o que significa ser política, perseverando contra as probabilidades de participar de processos políticos formais e defendendo diversos movimentos juvenis, ativismo de base e ação coletiva. Lideranças políticas e pessoas detentoras de poder devem apoiar as meninas, atuar pelas meninas, à medida que mudam a configuração da política”, afirma Stephen Omollo, CEO da Plan International. Para ele, é fundamental que as vozes de meninas e jovens sejam ouvidas. “É fundamental como um direito, fundamental para moldar as políticas públicas e decisões que influenciam suas vidas e para alcançar a igualdade de gênero.”

O que é importante para as meninas – Apesar do desalento em relação à política nacional, as meninas que participaram do recorte brasileiro da pesquisa veem na participação política uma forma de melhorar a situação de meninas e jovens na sociedade (69% no Brasil e 67% na pesquisa global) e também de tornar os espaços políticos mais inclusivos e representativos (66%). No estudo global, as meninas ainda relatam a importância de atuar como modelo para a próxima geração (56%, 51% no Brasil). A eleição para a Câmara dos Deputados este ano dá uma pista da importância dessa representatividade. A bancada feminina será 18% maior em 2023, com 91 parlamentares mulheres – neste ano, o número de candidatas à Câmara também aumentou, chegando a 34,9% do total. E foram eleitas as duas primeiras deputadas federais trans.

As meninas não deixam dúvidas no que consideram prioritário para as ações políticas no país: combate à pobreza e ao desemprego (76%), acesso à educação (68%), questões ambientais, incluindo poluição e desmatamento, e mudanças climáticas (54%), conflito e paz, crimes e violência comunitária (51%), discriminação com base em raça e etnia e direitos LGBTQIA+ (44%) e saúde mental e física, incluindo saúde e direitos sexuais e reprodutivos (44%). As questões que receberam menos votos foram abuso on-line e desinformação (8%), violência baseada em gênero (23%) e a resposta à pandemia de Covid-19 (26%).

Quando se engajam em ações de espaços de poder e política, as meninas e jovens brasileiras seguem lideranças políticas em redes sociais (57%) e em diversas plataformas (56%), e exercem seu direito ao voto (54%). Elas também se engajam em abaixo-assinados on-line ou pessoalmente (36%). Juliana, de 15 anos, do Maranhão, participou da pesquisa e relatou uma situação vivida na escola. “Fizemos um protesto e fomos até um de nossos professores, o de Ciências, que nos ajudou. E quando o diretor viu, ficou bravo e decidiu fazer algo a respeito. Com o tempo, as coisas melhoraram”, afirma. Ela, outras alunas, mães e pais participaram de greves para protestar contra a falta de funcionários e as instalações ruins em sua escola, até que a diretoria entrou em ação.

O ativismo estudantil é uma das formas de participação das meninas em espaços de poder. No Brasil, 13% das participantes fazem parte de redes de ativismo jovem e 26% integram grêmios estudantis. Mas os canais on-line têm mais força na mobilização: 32% fazem parte de grupos de WhatsApp ou outras plataformas para discutir política e assuntos comunitários, 24% seguem ativistas, movimentos sociais e lideranças políticas nas redes sociais. É pela internet, e em especial pelas redes sociais, que elas se informam sobre política (61%), mas sem deixar de lado a família (54%) e a escola ou universidade (50%).

Sobre a pesquisa – Os dados foram coletados entre fevereiro e abril de 2022 por duas empresas de pesquisa, a IPSOS e a GeoPoll, em nome da Plan International. Um total de 28.751 meninas e jovens mulheres participaram da pesquisa em 29 países (Alemanha, Austrália, Áustria, Bangladesh, Bélgica, Brasil, Canadá, Colômbia, Equador, Espanha, EUA, Filipinas, França, Guiné, Holanda, Indonésia, Itália, Japão, Malawi, Nepal, Nigéria, Peru, Quênia, Reino Unido, Suécia, Suíça, Togo, Vietnã, Zâmbia). Em cada país, exceto na Suíça, onde a meta era 500, o objetivo era coletar respostas de 1 mil meninas e jovens mulheres de 15 a 24 anos.

Sobre a Plan International – A Plan International é uma organização humanitária, não-governamental e sem fins lucrativos que promove os direitos das crianças e a igualdade para as meninas. Acreditamos no potencial de todas as crianças, mas sabemos que isso é muitas vezes reprimido por questões como pobreza, violência, exclusão e discriminação. E as meninas são as maiores afetadas. Trabalhando em conjunto com uma rede de parcerias, enfrentamos as causas dos desafios de meninas e crianças em situação vulnerável. Impulsionamos mudanças na prática e na política nos níveis local, nacional e global, utilizando o nosso alcance, a nossa experiência e o nosso conhecimento. Construímos parcerias poderosas há mais de 80 anos e que se encontram hoje ativas em mais de 70 países.

 

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